Sunday, December 28, 2008

COMO NESSA VÉSPERA DE 29 DE DEZ DE 1962....

A mesma alegria
O mesmo sol
O sorriso que nos vem de dentro e tudo invade
Esse não temer
Essa serenidade que permite o abadono
A comunhão do corpo para lá do corpo
Esse tocar a eternidade

Por cada um dos dias da vida partilhada
Com tudo
Tudo mesmo o que a vida tem dado
Esse sempre «de mãos dadas»

Hoje
como nessa véspera de 29 de Dezembro de 1962
Hás-de dar-me uma rosa numa porta a transpor

Louvado seja o dia.

Friday, December 26, 2008

ESTRELAS...

Hoje, entre idas e vindas, encontros, palavras e ausências, vim até aqui, quase culpabilizada «pelo tempo que nunca me chega». Mas é mais forte do que eu. Carrego primeiro na «Caixa de Costura» do André ( o André é meu filho ) e depois não resisto. Carrego na «leitaria».
Acontece que encontrei uma estrela. A Inês.
Bem haja, Inês.
Tomaremos o chá, qualquer coisa. Proponha. Havemos de conseguir.
Qualquer coisa há-de dar. Para tecer os laços, termos rosto e termos voz.

E esta boa surpresa que tive, faz-me contar como os gestos mais banais podem ser «estrelas».
No Natal ou na vida.
É uma senhora que só conheço do cabeleireiro.
Viúva muito cedo.
Depois uma ligação de que fala abertamente. «Com o engenheiro».
Há uns anos, «o engenheiro» morreu.

No sábado disse-me que no dia seguinte fazia anos. Pedi-lhe o telefone e «se não se importava que lhe telefonasse. Mas não queria incomodar»
Já eram dez da noite. Telefonei. Palavras rápidas. Quase circunstanciais.

Quando a voltei a encontrar, disse-me que costumava desligar o telefone para descansar, mas que tinha tido um pressentimento. E eu toquei.
Que quando desligámos,lhe tinham saltado umas lágrimas.
«É que bem vê, estou muito só. Passei a tarde no Estoril. Depois, p'ra casa...»

E a mim, que não me esforço mesmo nada em fazer um telefonema, doem-me as omissões.Tantas as omissões.
E uma estrela é tão fácil.
No Natal.
Em cada dia.
Pode dar ânimo.
Vida que nasce.
Como o Menino de Belém.
Como cada vida.
Como as palavras da Inês.

Sunday, December 21, 2008

O NASCIMENTO

Aí vem a estrela! Aí vem, sobre a montanha,
Rompendo a sombra etérea do crepúsculo!
A paisagem tornou-se mais estranha,
Mais cheia de silêncio e de mistério!
Dormem ainda as árvores e os homens,
E dorme, em alto ramo, a cotovia…
E, se ergue já seu canto, é porque sonha
julga ver, sonhando, a luz do dia!

E, pelos negros píncaros, a estrela
É divino sorriso alumiante.
Oh, que esplendor! Que formosura aquela!
É lírio de oiro aberto! É rosa a arder!

Aí vem a estrela! Aí vem, sobre a montanha,
Tão virginal, tão nova, que parece
Sair das mãos de Deus, a vez primeira!

E como, sobre os montes, resplandece!

Persegue-a o sol amado… No oriente,
Alastra um nimbo anímico de luz.
E a antiga dor das trevas, suavemente,
Ondula, em transparência e palidez.

Aí vem a estrela, alumiando a serra!
E os olhos encantados dos pastores
Voltam-se para a estrela… E cá na terra
Há mágoas e penumbras, a fugir…

Como ela voa, cintilando e rindo
Aos penhascos agrestes e desnudos!

E os pastores, atentos, vão seguindo
A direcção etérea do seu voo…

E a quimérica estrela deslumbrante
Parou sobre a capela, onde a Saudade
Agasalhava o Deus recém-nascido,
Com seu manto de amor e claridade.
E, amparando-o nos braços, lhe estendia
Os seios maternais. A criancinha
Mamava. E a Saudade lhe sorria,
Num enlevo, num êxtase sagrado.

A primavera, errante no Marão,
Veio cobrir de lírios e de rosas
O berço do Menino. E veio o outono,
E vieram ermas sombras dolorosas.
Logo, o outono rezou a sua prece

De cinzas e de bruma. E o lindo sol,
Entrando pelos vidros, aparece,
Junto ao pequeno berço. E toda a luz
Do céu veio com ele! E veio a noite.
Vieram as avezinhas, que deixaram,
No recôndito ninho, abandonados,
Os filhos ainda implumes. E cantaram
Em louvor do Menino e da Saudade.

E Marânus sentia, mais alegre,
Tornar-se vida, amor, fecundidade,
A sua antiga e mística tristeza.

E, ao ver a própria alma da sua raça
Criar a Virgem Mãe dum novo Deus,
Eis que à flor dos seus lábios esvoaça
O sorriso supremo da vitória.

E a Saudade, num casto e luminoso
Gesto de amor, tomando, novamente,
O Menino nos braços, o embalava.
E sobre ele inclinava docemente
A fronte aureolada. E uma canção,
Que era feita de todas as cantigas,
Mais num murmúrio brando de oração

Que em voz alta, cantava. E o Deus menino,
Com os olhos abertos, num espanto,
Recebia do mundo a clara imagem
E o seu nubloso e misterioso encanto…

Também o bom pastor, a quem Marânus
Havia prometido o Nascimento,
Sentia em seu espírito surgir,
Envolto num astral deslumbramento,
Estranho e novo ser, que dissipava
O seu velho crepúsculo interior,
Onde um fantasma, trágico e nocturno,
Aparição do medo e do terror,
Furibundo, reinava, desde os séculos!

O Menino crescia, como a aurora
Que, sendo esparso vulto de mulher,
Na linha do horizonte, que descora,
Lembra a auréola dum Deus anunciado…

Em volta dele, as coisas se animavam
Dum sentido mais belo e verdadeiro;
E a sua alma oculta desvendavam,
Como na luz primeira da Existência.

Mundo transfigurado! Ó terra santa!
Ó terra já divina e toda erguida
Àquela altura ideal da Eternidade,
Mais uma vez, a morte foi vencida!

Alguns dias passaram. E Marânus
Disse que ia partir à sua Esposa,
E que se entregava ao casto amor, tão puro,
Desta leal paisagem montanhosa.
E, chorando, abraçava-a, e repetia
Que tinha de partir; mas, dentro em pouco,
Por uma clara noite, voltaria.

E a trágica Saudade, sufocada:

«Eu bem conheço a voz que te chamou!
Voz que ilumina as árvores e as nuvens,
E que meu ser antigo transformou
Neste meu ser anímico e perfeito.»

E, mais serena e resignada: «Vai!
Cumpre a sua vontade. É teu destino…»

E beijando-o nos lábios, e tomando
Em seus braços de imagem o Menino,
Subiu a um alto píncaro escarpado,
De onde ela, por mais tempo, contemplasse
O esposo e companheiro bem amado.

E, sozinha, de pé, sobre um rochedo,
Disse-lhe um longo adeus.
E, já distante,
Marânus, ansioso, para trás
Volvia a face triste, a cada instante.
E parava, cismando…
Mas, ao longe,

O corpo da Saudade, vago e incerto,
Perdia-se, no ar que se turbava…

Anoitecia. A serra era um deserto.
E Marânus seguia o seu caminho.

Teixeira de Pascoaes

Friday, December 19, 2008

Porque ontem nos lembrámos e dissemos de cor...

NATAL E NÃO DEZEMBRO

Entremos, apressados, friorentos,
numa gruta, no bojo de um navio,
num presépio, num prédio, num presídio
no prédio que amanhã for demolido...
Entremos, inseguros, mas entremos.
Entremos e depressa, em qualquer sítio,
porque esta noite chama-se Dezembro,
porque sofremos, porque temos frio.

Entremos, dois a dois: somos duzentos,
duzentos mil, doze milhões de nada.
Procuremos o rastro de uma casa,
a cave, a gruta, o sulco de uma nave...
Entremos, despojados, mas entremos.
De mãos dadas talvez o fogo nasça,
talvez seja Natal e não Dezembro,
talvez universal a consoada.


David Mourão-Ferreira

Sunday, December 14, 2008

NATAL

Faz amanhã anos o nosso neto Francisco.

O Francisco
O Quico
O nosso segundo neto
O segundo filho da Maria e do Paulo

Por causa da operação ao peito é o único a quem não fiz o casaquinho de nascer.
Comprei-lhe. E não ficou mal, que o rapaz era um lindo bebé.
Salvou-se a manta em malha grossa debruada a fita de xadrês. Ainda tenho ali um restinho dessa fita em seda de xadrez.

Com o Francisco aprendi o gosto pelas bruxas. Lembras-te, uma caixa com sseis bruxas que recebeste num Natal?
Os passeios exaustivos ao Chiado
os museus
o convento do Carmo
e...
e...
e...

Hei-de aprender muito mais com o Francisco.
Ele elogia as minhas malhas
e estou-lhe a dever uma manta para a cama (agora enorme, claro)

O Francisco é escuteiro

O Francisco é
e vai ser
muito mais


Faz treze anos.
Entra nos «teen»

Parabéns, rapaz.
Agarra a vida.
É amanhã o teu Natal.

E AINDA ASSIM, SERÁ NATAL

LADAINHA DOS PÓSTUMOS NATAIS


Há-de vir um Natal e será o primeiro
em que se veja à mesa o meu lugar vazio

Há-de vir um Natal e será o primeiro
em que hão-de me lembrar de modo menos nítido

Há-de vir um Natal e será o primeiro
em que só uma voz me evoque a sós consigo

Há-de vir um Natal e será o primeiro
em que não viva já ninguém meu conhecido

Há-de vir um Natal e será o primeiro
em que nem vivo esteja um verso deste livro

Há-de vir um Natal e será o primeiro
em que terei de novo o Nada a sós comigo

Há-de vir um Natal e será o primeiro
em que nem o Natal terá qualquer sentido

Há-de vir um Natal e será o primeiro
em que o Nada retome a cor do Infinito


David Mourão-Ferreira

Thursday, December 11, 2008

NATAL

Velho Menino-Deus que me vens ver
Quando o ano passou e as dores passaram:
Sim, pedi-te o brinquedo, e queria-o ter,
Mas quando as minhas dores o desejaram...

Agora, outras quimeras me tentaram
Em reinos onde tu não tens poder...
Outras mãos mentirosas me acenaram
A chamar, a mostrar e a prometer...

Vem, apesar de tudo, se queres vir.
Vem com neve nos ombros, a sorrir
A quem nunca doiraste a solidão...

Mas o brinquedo... quebra-o no caminho.
O que eu chorei por ele! Era de arminho
E batia-lhe dentro um coração...

Miguel Torga

Wednesday, December 10, 2008

ENTRE PARÊNTESIS NOS POEMAS DE NATAL(e tão importante...)

Às vezes, poucas vezes,
percorro os blogs dos que me visitam e que visito.
Entre a alegria e a vergonha, li o comentário de eMe e eMe.

E lembrei-me de TEACHER SIMPLE PAST.
Encontrei, mas não consigo comentar.

ONDE/COMO ESTÁ Înês?

P'ra já, um beijo
com saudades.

Quem diria.
Tanta ausência!
Tanto mar!

NATAL À BEIRA RIO

É o braço do abeto a bater na vidraça?

E o ponteiro pequeno a caminho da meta!

Cala-te, vento velho! É o Natal que passa,

A trazer-me da água a infância ressurrecta.


Da casa onde nasci via-se perto o rio.

Tão novos os meus Pais, tão novos no passado!

E o Menino nascia a bordo de um navio

Que ficava, no cais, à noite iluminado...


Ó noite de Natal, que travo a maresia!


Depois fui não sei quem que se perdeu na terra.

E quanto mais na terra a terra me envolvia

E quanto mais na terra fazia o norte de quem erra.


Vem tu, Poesia, vem, agora conduzir-me

À beira desse cais onde Jesus nascia...


Serei dos que afinal, errando em terra firme,

Precisam de Jesus, de Mar, ou de Poesia?



David Mourão-Ferreira, Obra Poética 1948-1988

Tuesday, December 09, 2008

NATAL CHIQUE

Percorro o dia, que esmorece
Nas ruas cheias de rumor;
Minha alma vã desaparece
Na minha pressa e pouco amor.

Hoje é Natal. Comprei um anjo,
Dos que anunciam no jornal;
Mas houve um etéreo desarranjo
E o efeito em casa saiu mal.

Valeu-me um príncipe esfarrapado
A quem dão coroas no meio disto,
Um moço doente, desanimado...
Só esse pobre me pareceu Cristo.

de Vitorino Nemésio

Monday, December 08, 2008

A CADA DIA UM POEMA QUE TE DIGA

Hoje de Miguel Torga:

«Leio o teu nome na página da noite,
Menino Deus ...
E fico a meditar
No milagre dobrado
De ser Deus e menino.

Em Deus não acredito.
Mas de ti como posso duvidar?

Todos os dias nascem
Meninos pobres em currais de gado.
Crianças que são ânsias alargadas
De horizontes pequenos,
Humanas alvoradas ...
A divindade é o menos.»

PARA O ANDRÉ E PARA TODOS OS QUE SE ZANGAM COM O NATAL

De Jacques Prévert

«Noël des ramasseurs de neige»

«Nos cheminées sont vides
nos poches retournées
ohé ohé ohé
nos cheminées sont vides
nos souliers sont percés
ohé ohé ohé
et nos enfants livides
dansent devant nos buffets
ohé ohé ohé
Et pourtant c’est Noël
Noël qu’il faut fêter
Fêtons fêtons Noël
ça se fait chaque année
Ohé la vie est belle
Ohé joyeux Noël
Mais v’là la neige qui tombe
qui tombe de tout en haut
Elle va se faire mal
en tombant de si haut
ohé ohé ého
Pauvre neige nouvelle
courons courons vers elle
courons avec nos pelles
courons la ramasser
puisque c’est notre métier.
ohé ohé ohé
jolie neige nouvelle
toi qu’arrives du ciel
dis-nous dis-nous la belle
ohé ohé ohé
Quand est-ce qu’à Noël
tomberont de là-haut
des dindes de Noël
avec leurs dindonneaux?
ohé ohé ého !»

E se se lembram, este poemaestá musicado.
Cantávamos.
Cantamos.

E faz pensar.
Que é preciso que o Natal não «seja só isto»ou «não seja isto».

Transportamos a pergunta final do poema:
«Quand est-ce qu'à Noël
tomberont de là-haut
des dindes de Noël
avec leurs dindonneaux»

E é só nossa a resposta.

De cada um.

Beijo para todos.

E «um outro Natal»

DIA DA MÃE

Sei que gostava de escrever uma postagem mais longa.

Mas, ainda que já tão tarde,
deixo estas palavras, memória e também vida
do dia de hoje

que sempre foi e é
o dia da Mãe.

Em 8 de Dezembro

Thursday, December 04, 2008

DIZER A ESPERANÇA

Retirado do site da Pastoral da Cultura
com o aplauso de quem sabe que só a Esperança nos sustém.

Sabemo-lo todos, creio.

«A fé que mais amo, diz Deus, é a esperança
A pequena esperança avança no meio das duas irmãs mais velhas e nem sequer se repara nela.
No caminho da salvação, no caminho carnal, no caminho áspero da salvação, no percurso interminável, no percurso, entre as duas irmãs a pequena esperança
Avança.
No meio das irmãs mais velhas!
A que é casada.
E a que é mãe.
E só se dá atenção, o povo cristão só dá atenção às duas irmãs mais velhas.
A primeira e a última.
Que acodem ao urgente.
Ao tempo de agora.
Ao momentâneo instante que passa.
O povo cristão só vê as duas irmãs mais velhas, não tem olhos senão para as duas irmãs mais velhas.
A que está à direita e a que está à esquerda.
E a bem dizer não vê a que está no meio.
A pequena, a que ainda anda na escola.
E que caminha.
Perdida nas saias das irmãs.
E facilmente crê que são as duas grandes que levam a pequena pela mão.
No meio.
Entre elas duas.
Para a fazerem percorrer esse caminho áspero da salvação.
Cegos que pelo contrário não vêem
Que é ela que no meio arrasta as irmãs mais velhas!
E que sem ela elas nada seriam
Senão duas mulheres já idosas.
Duas mulheres de certa idade
Amachucadas pela vida.
É ela, essa miúda, que tudo arrasta.
Porque a Fé só vê o que é.
E ela, ela vê o que será.
A Caridade só ama o que é.
E ela, ela ama o que será.»

Charles Péguy (1873-1914)

Sunday, November 30, 2008

CHARADA

Tenho um amigo que vive num castelo.

Com esta idade toda eu nunca tinha visto um castelo a sério.
Fica no coração da cidade.
Tem uma infinidade de portas.
É preciso abri-las com chaves.
Todas diferentes.
Corredores
em muitos planos.

Pode parecer que uma pessoa se perde.
E não.

Este castelo,
estes corredores
dirigem-nos sempre, de forma estranhamente misteriosa e natural,
até a um encontro qualquer
que
- comigo aconteceu assim -
geralmente é o encontro connosco.

COISAS SIMPLES...

Hoje, o Manel passou-me o telefone.
O meu neto mais velho. Dezóito anos quase. Mesmo quase.
Procuro as palavras adequadas.

- Diz lá, B.
- É só para dar um beijo à avó.

Coisa linda e boa.
Digo-lhe a surpresa e o bálsamo.

E ele:

- Um,não, avó. Muitos.

Noite abençada.
Vida grata.
Oração.

Tuesday, November 25, 2008

SAUDAR A INÊS DE CASTRO, A PAULA ROLÃO (? NÃO TENHO A CERTEZA DO NOME...)

Tenho estado calada, com uma série de ocupações.
Mas saltei de um texto que tenho ainda para enviar hoje.
Para dizer que neste «P'rós e Contras» tenho IMENSA VERGONHA da figura que tem feito a maioria dos professores.

E uma saudação à Inês (lembras-te que nem sempre concordámos nos anos que estive contigo no Monte da Caparica. Já tantos, não é? O meu afecto e saudades. A ver se vou a um almoço de Natal.)e à Paula Rolão.

Vou continuar o meu texto.
E a ver se volto com mais calma.

Sunday, November 09, 2008

HOJE ...

Hoje estava um belo dia de sol.
O Manel, bem melhor.

Fomos ao fim da tarde ver «A Turma» (bem melhor o título francês «Entre murs»).

Nem eu nem o Manel gostamos de dar opiniões logo a seguir a ver um filme.
As imagens como as palavras digerem-se Comem-se.

Só a recomendação de que vale a pena.
É a visibilidade de um universo que se não conhece.
E dá para reflectir que não há por um lado «bons» e por outro «maus». Que nem tudo é «tal qual».

Como tudo.
Como a vida toda.

Saturday, November 08, 2008

OUTONO, CASTANHAS E COMO É BOM PISAR AS FOLHAS SECAS

Ai, o Outono e a beleza das folhas secas na cidade!
E as castanhas! Esse cheirinho. E o fumo, suspeita de mistério em cada rosto.

Era quando eu escrevia um postal à minha mãe em Tibaldinho (ou era mais cedo?) a dizer «Mãe, venha, que já há castanhas.». Ela vinha. Por dois ou três dias a nossa vida era um paraíso. Depois, voltávamos àquele «cão e gato» de mãe e filha, que é como tanta vez se diz o amor.

Hoje quero pedir («pedir», mais para o lado de «ordenar») aos meus netos que se alegrem e pisem mesmo as folhas secas (Bernardo, lembras-te, uns primeiros passitos na Praça do Giraldo? Bem vês que «nada como o tempo para passar»…).
E também, mesmo com a crise, vá lá, arranjem maneira e também um eurozito para umas castanhitas assadas.
Aquele cheirinho… Aquele fumo…
Mistério a vida toda.
Em tudo.

INTERVALO

Mais parece um vazio.
Mas não.
Foi um tempo em que o Manel de novo se submeteu a uma intervenção. Aqueles desentupimentos de artérias. Tudo programado, mas… Pronto, correu bem. Graças a Deus e aos médicos. A todo o pessoal do hospital. E ao afecto dos filhos. Dos amigos. Dos vizinhos.
E também das presenças,das memórias. É nestas alturas que me lembro tanto da minha mãe. Dessa coragem a vida toda. Dessa capacidade de tudo enfrentar. De pé.

Wednesday, October 22, 2008

MEMÓRIAS A PROPÓSITO DE ONTEM, 21 DE OUTUBRO


A ver se adivinham quem está no «embrulhinho»
À volta, não é difícil. A ternura, a alegria, a festa de uma família que leva «tal embrulhinho» a baptizar.

E a refilice da mãe para o sacristão que afirmava «é a madrinha que traz a criança».
«A mãe sou eu. Eu é que o trago».

Friday, October 17, 2008

HORA DE ALMOÇO

Carrego em «iniciar sessão».
E continuo. «Nova postagem»
À procura de mim.

E à direita, em baixo, o computador aponta 13h11.
O almoço.
Reajo mal. E digo «É sempre assim»

Preparo-me para fechar tudo. Um bocado zangada.

Mas sei que é nas rotinas que tanta vez me encontro. Nestas e noutras.

E vem-me certinha a afirmaçÃO de Teresa de Ávila que admiro cada vez mais) «Deus está entre as caçarolas».

Hei-de encontrar-me, claro.

Sunday, October 12, 2008

PARABÉNS JOAQUIM FRANCO

Pela coragem da reportagem que hoje vi na Sic e que julgo se chamava «Os padres e a política».

Doeu-me e regozigei-me por estes homens.

O cristianismo tem consequências.
Às vezes duras.
Sempre proféticas.

Gostei muito da serenidade de Maria do Rosário Carneiro.

Cai a noite com um certo nó na garganta.

E a certeza de que «quando o Filho do homem vier encontrará a fé sobre a Terra».

Friday, October 10, 2008

DIANTE DE MIM

Ontem o Manel fez um cataterismo.
Eu sabia que ele estava cheio de medo.
Eu também.

Foi bom, ficar ali sozinha no quarto.
Esperar um tempo que pareceu imenso.
Tentei reler «O Diário de Etty». Sei que qualquer página serviria.
Mas não dava.
Peguei na malha.
No silêncio.
No medo.
No estar ali sozinha.
Nalgumas, poucas, lágrimas serenas

E tudo isto foi uma oração.

Talvez se comece a revelar o que escondem afinal os meus novelos.

Nota - O cataterismo correu bem.

LOBO ANTUNES, UM COMEÇO

Não ouvi a entrevista de Mário Crespo a Lobo Antunes. Só um excerto.
Faz-me voltar aqui.
Partilhar as palavras e o que revelam.
Não as terei retido certinhas, mas arrisco
«A morte de um pai é terrível.
Um pai está entre nós e a morte.
(...)
Depois, quando a morte bater, somos nós a abrir-lhe a porta.»
E
«É como um fim de semana.
Durante a semana ainda vá que não vá. Horários. tarefas.
No fim de semana, estamos perante nós próprios.»

«Ou como a reforma.
Um casal passa a tropeçar no quotidiano de um outro.»

Tal qual.

E Mário Crespo

«É preciso dizer «ontem não te vi em Babilónia.»

Lobo Antunes - «E gostava de te ver»

Reinventar o dia.

Um começo.

Thursday, September 18, 2008

A CRISE FINANCEIRA E NOVELOS EMARANHADOS

Acabei de ouvir o dr. F. Ulrich que comparou a crise financeira com os novelos que uma avó trabalha e que são emaranhados pelos netos.
Conheço bem esta situação - novelos emaranhados pelos netos.
E quem vai lá por casa também a conhece.

A pergunta é quase sempre «A avó dá-nos um ou dois novelos?»
Das primeiiras vezes, dei. Achei piada.
Mas... tornou-se grave.

O visado era sempre o Avô.
«Vamos prender o Avô.»

E os fios percorriam toda a casa.
O Manel obrigatoriamente sossegadinho no maple, preso por fios.
Os novelos não ficavam só emaranhados. Todos completamente desmanchados.
(Sem concerto).

Perdão, perdão sobretudo aos meus alunos, que lhes fiz a vida negra com os erros de ortografia. Leia-se CONSERTO.

Os fios pela casa toda.

E o Avô só liberto quando eu os conseguia a custo cortar com a tesoura da cozinha.

De qualquer forma ligou bem comigo esta imagem usada por F. Ulrich.
Numa época em que parece que já ninguém tira prazer em tecer um casaco ou uma mantinha...
E sei que a paciência e a sabedoria de uma avó é mesmo capaz de voltar a dobar os novelos.
Direitinhos.

Wednesday, September 10, 2008

DE NOVO,O ALGARVE...

Chegámos
De novo.

Chegámos tão tarde. Lá fora já é noite.
Atravessámos de carro a famosa «rua de cima». Tantos mundos.

O Manel já se deitou «um bocadinho». Vestido. Adivinho o pior....

Amanhã, há-de ser o mar.A areia. Mal que chegue à varanda do terraço.
E é como se fossem as férias todas. As do liceu com a barraca alugada, onde só cabiam os sapatos. Depois os m meus filhos. Primeiro só a Maria e isso era tranquilo (claro, já me esqueci do eléctrico e eu cheia de sacos de Galamares até à Praia das Maçãs...). Depois, o André, os meus sobrinhos, uma confusão.
Depois Lagos. A Zezinha. O Manel um pai estremoso. Eu à conta de uns postais, dava umas escapadinhas para a esplanada.

A vida assim.
Com muitos nomes.Muitos lugares.
E muito mais afectos.

Saturday, September 06, 2008

MÃE, EU NÃO SEI NADA....


A G mandou-me uma daquelas mensagens com anexos, que não costumo abrir.
Chama-se «A cadeira».
Esta é uma palavra que sempre foi para mim muito especial (tão longe e tão belas «As cadeiras» de Ionesco!).
Curiosa abri o tal anexo que falava de uma cadeira vazia, ao lado da qual é preciso que nos sentemos para falar com Deus.
E como precisamos da cadeira vazia para falar com Deus
para falar connosco
para esperar alguém.
A cadeira.

Logo a seguir (sabe-se lá porquê) lembrei-me, isto é, não me lembrei de um poema que recitávamos nos pequenos/grandes teatros da escola. Só sei do que se tratava. Uma rapariguinha, que chegava junto da mãe, ao fim de um dia de aulas e dizia, feliz «Oh mãe, eu já sei tudo!»
Olhou então os olhos tranquilos e calados da mãe e, entendeu.
O poema terminava com ela a dizer
«Oh mãe, eu não sei nada!»

Gostava de ter dito isto à minha mãe.
Mas estou a tempo de o dizer hoje a todos.
Aos meus amigos
Aos meus filhos
Aos meus sobrinhos
Ao Manel
Aos meus alunos
A cada um dos que cruzam os meus dias

E depois, ter essa cadeira vazia. E só dizer o silêncio.

Obrigada, G, pela «cadeira».

Saturday, August 30, 2008

FAZER ANOS EM TIBALDINHO



Faz anos o nosso rapaz.
Quer dizer, o primeiro dos nossos rapazes. Os outros são netos…
Hoje, o nosso filho André.
Para quem anda por aqui, o André é o dono da «Caixa de Costura».

PARABÉNS, ANDRÉ.

Acordei em Tibaldinho. Cedinho, o meu costume. Lá fora o cantar de um galo.(de dia, onde estarão os galos? E os outros animais da tua infância?)

Na memória, o dia em que nasceste.
Na cama, a meu lado, o pai. Sossegadinho. De vez em quando inconsciente, pergunta-me pelos meninos.
Os cachopos dormem ainda.

Começo da manhã. Serenidade. No campo, que isto ainda é campo (da janela ainda é verde o que se avista. Mas até quando? pergunta que na verdade não interessa nada…).

Cedo demais para mim, no corredor uns passitos ainda leves. Simula um susto à porta do nosso quarto. O Manel Júnior. Um abraço terno. «Parabéns, Manel. O pai faz anos.». «Parabéns, avó. O pai é o seu filho.».
Tal qual.
E outros passitos. O António.
Pronto. Salto da cama.
E é já a grande confusão.
Posso jogar no seu computador?.
Vou ao sótão ver os morcegos.
A bola, no quintal.
Avó, quero ver o DVD
.

Lembro-lhes que o João e o avô ainda dormem.
Nada.
E eu a querer escrever.

Rapazes.
Vocês dizem e são a vida. Garantem que ela «gira, como bola colorida».

E à falta de outro sossego, mergulhada na vida pelos teus filhos:
PARABÈNS ANDRÉ.

Hoje.
E todos os dias.

PS - Traduzindo: o André tem estado em Tibaldinho com os cachopos. Ontem foi ter com a Ana a Leiria. Voltam daqui a bocadinho. Almoço no Cortiço. Bolo do Patronato de Mangualde. Boa!
PS - A «foto» é do André, dois aninhos, de gato, muito chateado. Era o que havia. Meu rico menino... Mães!!!

Friday, August 22, 2008

PARA AGRADECER


Quando fiz os tais 68 em 8 do 8 de 2008, encontrei numa página da Net um texto de Vinicius de Morais ( que adaptei e escrevi num cartão e a que juntei a imagem de um abraço) para dar como agradecimento a alguns amigos que me deram os Parabéns.
Gosto muito do texto e aqui vai ele (pode ser que encontre a imagem, já sabem que não me ajeito, mas ... vamos ver):

«Procura-se um amigo (...), que se comova, quando chamado de amigo.
Que saiba conversar de coisas simples(...).
Precisa-se de um amigo para não se enlouquecer, para contar o que se viu de belo e triste durante o dia, dos anseios e das realizações, dos sonhos e da realidade(...).
Precisa-se de um amigo que diga que vale a pena viver, não porque a vida é bela, mas porque já se tem um amigo.
Precisa-se de um amigo para se parar de chorar.
Para não se viver debruçado no passado em busca de memórias perdidas.
Um amigo que nos bata no ombro sorrindo ou chorando, mas que nos chame amigo, para ter-se a consciência de que ainda se vive.»

Vinicius de Morais


E ainda nesse dia 8 do 8 de 2008, recebi um telefonema de um amigo a quem eu tinha dado o tal cartão. Não é pessoa de muitas falas. Mas quis telefonar-me. Disse:


«Teresa, melhor do que «precisar-se de um amigo», é «ter-se um amigo».

E é mesmo.

Mesmo.


Bem-haja. A todos.



DE VOLTA...

Em Tibaldinho há mais de uma semana.
Nem agradeci aqui os parabéns pelos anos. Escrevo agora a gratidão. E a alegria. Em 8 do 8 de 2008. 68 anos!
Bem-haja a cada um (na Beira não dizemos «obrigada» nem «obrigado»).

Não tem sido fácil o meu acesso à Net (o Manuel continua a trabalhar, vá lá... Concordo que pelo menos a cabeça resiste melhor).
Então, com pouco tempo (um nadinha enquanto ele faz uma sesta), lembrei-me que há cerca de um ano comecei a escrever sobre esta casa. Procurei o texto e aqui vai, porque as palavras desajeitadas estão envoltas em ternura e na nossa vida toda. Diz assim:

A CASA

A casa tem p’raí cem anos.
Não é de pedra como as casas da Beira.
É uma casa de emigrantes que vieram do Brasil, princípio do séc XX.
Sempre que voltamos quando o carro faz a última curva e a vimos ali, inteirinha e tudo, é um alívio.
«Ainda não caiu».
Lá está ela. Sempre de pé. A precisar de obras de fachada, com os portões numa desgraça, estragados e feios. Ainda abrem e fecham, mas às vezes precisam de uma trave para os aguentar.

A casa …

ESTE ANO

A casa continua a aguentar-se.
Já tem os portões todos novos, mas nenhum é de madeira. Sinais dos tempos...
A Maria e o Paulo pintaram a porta de cima.
Encomendámos outra porta para a cozinha.
As cadeiras tão antigas, de palhinha, cada ano mais esburacada pelos dedos dos meus netos, já estão arranjadinhas. E LINDAS MESMO.

Mas faltam sempre tantas coisas, tantas.

Pensando bem as casas parecem-se com a vida.
Julgamos que são fundo perdido.

E este é seguramente o maior legado.
Aquilo de que ninguém se vai esquecer.

E nem tenho uma fotografiazita... A ver se o Manel dá uma ajuda.

Wednesday, August 06, 2008

GOSTO....

Quero ir ver «A Outra». Fazer malha. Sossegadinha ao pé do Manel.
E também quero escrever. Um nadinha que seja.

Quero dizer aquilo de que gosto. É uma lista enorme. Vou-a escrevendo aos poucos, cada dia.

Gosto de laranjas.
Gosto dos limoeiros do quintal.
Gosto de sítios de que ninguém gosta- centros de saúde, filas nos correios. Toda a espécie de filas.
Gosto de combóios.
De estações de comboio e de ver o comboio a ir, na curva.
Gosto de percorrer sozinha as ruas das cidades. Porque assim as torno minhas.

Sobretudo eu gosto muito de gostar. Preciso muito de gostar. Sei que é assim que vivo. Parece que só assim posso viver. Gostar.

A lista há-de amanhã continuar.

Saturday, August 02, 2008

Do «Diário» de Etty Hillesum

Transcrevo um quase nnada, que hoje teve tanto a ver comigo:

«Algum tempo atrás, tinha dito para mim mesma:«Vou exercitar-me a ajoelhar.» Ainda tinha demasiada vergonha desse gesto que é tão íntimo como os gestos amorosos, acerca dos quais ninguém consegue falar a não ser que seja um poeta.»

Friday, July 25, 2008

UM DIA DESTES

Navegando ao acaso, aí pela Net, encontrei de Raúl Brandão:

«Um dia destes temos de nos separar, e é natural que seja eu, que sou mais velho, o primeiro a partir... Antes porém, quero dizer-te que te devo o melhor da vida. Foste tu que me desvendaste o amor, que eu desconhecia. A bondade e a ternura, que eu desconhecia. Não exerci talvez nenhuma influência na tua alma – tu apaziguaste-me. O amor era em mim um simples impulso: criaste-o, e pouco a pouco essa força nas tuas mãos se transformou em sentimento religioso.Olha para os meus cabelos todos brancos... Julgava que o amor ia diminuindo com o tempo – e o meu amor não cessa de aumentar até à morte e para além da morte.»

E transcrevo-o, porque, sei por mim, sei por nós que nada conta senão «o amor que não cessa de aumentar até à morte e para além da morte.»

Tuesday, July 15, 2008

A ESCOLA, SEMPRE


Desafiaram-me que fosse até lá. Um almoço partilhado, género festa de fim de ano à conta de quatro colegas que se reformavam.

Feliz pelo desafio, fui.
E foi tudo muito bom.
Os rostos que via todos os dias, à distância da separação, tornam-se cheios de novidade e brilham de sorrisos.

Realmente, tenho aprendido que a distância me dá um novo olhar.
Sem preconceitos.
Límpido.

Mais parecido com a primeira de todas as manhãs.

ANTÓNIO JOSÉ ESTEVES


Pudéssemos esquecer que não estás aqui.
Pudéssemos esquecer que não saberás o sorriso nem o choro daquela criança, a tua primeira neta, p'ra nascer.
E que Tibaldinho não mais te encontrará pelos caminhos.
Nem em nenhum lugar.

Pudéssemos esquecer este «nunca mais» e talvez Fernando Pessoa nos confortasse. Talvez. Por isso, a medo, o transcrevo.
Ainda que cada um de nós dolorosamente saiba que a morte não tem qualquer consolo, nem justificação, nem nada.

Então, de Fernando Pessoa

«A morte é a curva da estrada,
Morrer é só não ser visto.
Se escuto, eu te oiço a passada
existir como eu existo.

A terra é feita de céu.
A mentira não tem ninho.
Nunca ninguém se perdeu.
Tudo é verdade e caminho.»

E vou procurar uma qualquer imagem do teu tão amado Tibaldinho e ver se inabilmente a consigo aqui postar.

Saturday, July 05, 2008

EM LOUVOR DOS QUE HOJE DÃO PÃO COM CHEIRO A ROSAS

Escrevi ontem «isto» para o Meditando da RR. E deixo-vos aqui para continuar a homenagear alguns espaços e tanta gente do meu bairro. Gente que vale a pena. Diz assim:
«No dia em que festejamos Santa Isabel, Rainha de Portugal, quero lembrar-Te, Senhor, todos aqueles que fazem da vida, um regaço onde transportam pão como se fossem rosas.
Cruzam-se connosco.
Todos os dias e de forma anónima.
Falo-Te, Senhor, do comércio do meu bairro. Do cabeleireiro. Do mercado. Do café. Do restaurante onde às vezes posso ir.

Estão ali e ouvem-nos. Confortam as nossas dores. Olhe que vai tudo correr bem. E contam, inventando talvez, a história semelhante de outra vida com um final feliz.
Partilham as nossas alegrias como se fossem suas. Dão um conselho: Gostava de lhe fazer corte assim. Veja lá como é que vai aos anos do seu neto. Ele merece. E mostram o tal corte na revista.
Esforçam-se por encontrar o que está ao alcance das nossas bolsas. Hoje as cerejas estão mais baratas. E arredondam p’ra baixo.
Para os doentes, encontram qualquer coisa que lhes há-de saber bem.

Rainha Santa Isabel de Portugal intercede também por estes que como tu transportam pão. Cheiram a rosas.»

Thursday, June 26, 2008

PARABÉNS, ANA




Não só
porque és a mulher do meu filho André
não só porque és a mãe dos Marias
nem a minha «nora» (mesmo quando eu digo que ela é muito querida, «nora» não é nome que se dê a ninguém, é antes um conjunto de vasos que tira a água do poço na quinta do meu avô).

Parabéns Ana,
porque és a menina que o André nos trouxe e com a Maria, ficámos logo com duas,
porque gostas de cerejas,
porque gostas de rir,
porque falas muito alto (sabe toda a gente que «nada comparado comigo»... não tem importância nenhuma e até é giro)
porque estavas lá quando eu acordei daquela operação mais complicada, lembras-te Vai comer, sim senhora, que sou eu que lhe vou dar. E ficaste ali,
porque tens muitos amigos de quem gostas tanto,
porque te deixaste encantar com os bordados que a avó Alice fez para o André, quero dizer, para vocês,
porque pões na mesa a toalha de linho já tão desfiadinha numa ponta e que vem sei lá donde,
porque sofres com a dor dos outros,
porque choras
e também te alegras
porque és mesmo minha amiga e esqueces que eu sou a sogra (outro nome horrível!) e que acho sempre que o meu menino é o máximo, embora sabendo que não sou eu que vivo com ele, nem com os peixes dele, nem com o trabalho dele, nem ...

porque no inesperadamente bom e mau de que se faz a vida,
tu sabes ser feliz.
Este texto, bem sabes, está tão incompleto. Como tudo na vida. E há que aceitar esta incapacidade de alguma vez dizer ou fazer tudo. «Senão nem saberíamos morrer» . E nem saberíamos viver...

Parabéns, Ana.
( e parece consensual que quarenta é uma idade de excelência. Para mim foi)

Thursday, June 19, 2008

HOMENAGEM AO CABELEIREIRO DA GRAÇA


Claro, em Campo de Ourique.
Comecei por ir lá porque era barato.
Continuei. Ficava «mais compostinha».

Hoje vou mais vezes, ... A ver se esta gordura horrível, fica menos visível com o cabelo ajeitado.
E o trabalho é bom.
Por justiça e homenagem, quero dizer que este espaço é de convívio e é de ajuda.
Toda a gente é bem recebida. Além do arranjo do cabelo, a Graça ou a Diana e até a empregada dão sempre uma palavra de ânimo. Procuram indicar um médico se há uma doença e mesmo quando é grave dizem que vai correr tudo bem; quando alguém anda p'rá aí ao sabor do tempo sem porquê insistem com zelo que fique mais um bocadinho, sempre está acompanhada.
Interessam-se. Cuidam.
Voltamos mais animadas. Falámos. quantas vezes desabafámos ou trocámos experiências. Dissemos dificuldades. E também alegrias. E ficamos contagiadas por esse cuidado.

É verdade que há outros espaços assim neste bairro. Sobretudo os cafés. E a farmácia. (devo estar a omitir alguns injustamente.... )

Tenho pensado nesta realidade.
E noutra realidade que aqui deixo em jeito de desbafo, mas com dor - Por convicção católica e ainda com vontade para muitas tentativas de procurar mais humana a Igreja que escolhi e escolho, gostava tanto de ver o espaço da igreja do meu bairro, um bocadinho que fosse, mais parecido com o cabeleireiro da Graça.
Aqui a esperança é difícil.
E por feitio, teimo. Desistir não é mesmo comigo.

Tuesday, June 17, 2008

DE COMBOIO...


Acabo de ler a última postagem do André. E gostei tanto. Tive muita vontade de fazer uma viagem de comboio. Toda a vida me seduziram. Desde aqueles em que voltava de Tibaldinho e antes de Lisboa passava o túnel do Rossio. Depois, meia a dormir, já no taxi p'ra casa, ouvia a minha mãe Teresinha, olha, estamos quase a chegar. Entreabria os olhos e via os anúncios com luzes a piscarem. Uma máquina Singer com as rodas a rodarem mesmo. Eu acordava.
E tantas viagens! Sempre p'ra Tibaldinho. Sempre para essa casa «de sempre». Ainda hoje para lá telefonei, que lhe dessem uma limpezasinha . E como é bom voltar. É que a casa «de sempre» contem a vida toda. Inteirinha. Inteiros os afectos. Os sonhos. As loucuras. As gerações de todos os que lá viveram e me amaram, eles que nas coisas de nada - cada ano descubro mais algumas - dizem também a vida.

Ficava aqui , feliz a escrever! São três e meia da manhã. Já não há televisões , nem telefonias, nem futebol, nem barulho nenhum. Não tocam os telefones. Não há palavras de encontro ou desencontro. Nas traseiras não há luzes. Mas julgo que a prudência me manda que durma qualquer coisa. Amanhã é o último dia para dar uma mão aos rapazes com exame de Língua Portuguesa na quarta-feira. E mais outras tarefas. Vou render-me... E tenho tanta pena de não ficar por aqui.

Só mais umas palavras - também havia - e lembro-me - viagens de comboio a noite toda. Parece que se chamava o comboio do correio, já não sei. Numa delas, teria dez anos, nove e eu ia com o meu pai. Olhei a noite muito escura p'la janela. Foi quando lhe perguntei e já sabia a resposta Pai, quando se morre o céu não é lá em cima, pois não?

Bem, vou então render-me. Vou deixar esta viagem de comboio que me trouxe a postagem do André e que agradeço.

Também estou pr'áqui com umas lágrimas a saltarem. Não, não vou deixar.

Friday, June 13, 2008

O NOME «ANTÓNIO»


Gosto do nome António.

Tive um avô António, que não falava, quase não comia. e deu-me um dia o mais que soube. Uma nota de 20 escudos. Morreu numa quinta-feira. Sei, porque era o dia do Suplemento Juvenil do Século e cairam-me nele imensas lágrimas. Imensas lágrimas.

Também o meu padrinho era António. Chamávamos-lhe Titão, sei lá porquê. Apaixonou-se por Tibaldinho, onde ia todos os anos, num daqueles carros que já nem consigo visualizar e que a minha avó enchia de couves e batatas. O quarto onde ficava, é de certo modo, ainda o seu. Um dia, às escondidas do meu pai, deixou-me guiar até ao Cruzeiro da Lama... Bem... espero que os rapazes não leiam isto.

Hoje tenho imensos Antónios de quem gosto muito e a quem mandei uma mensagem por telemóvel.

Muitos amigos. E muito bons.
Um cunhado que adoro.
Um compadre tão especial.

E um neto, o mais pequeno, o mais lindo de todos os Antónios.

Gosto do nome «António»...

MAIS PERTO...

Soubesse eu fazer a transcrição certa de um diálogo como a C do 100nada (já não sei se é assim o nome do blog...).
E tento. Em tema e tempo tão diverso.

Fim do dia, ao telefone

-É a Teresa?
Eu, que sim.
- Fala M M.Às vezes sou rápida e percebi quem era. A voz firme. E um jeito de afecto amigo, que passava, não sei explicar como.
- Olá, viva. Como estás?
- Olha vamos procurando resistir.
Eu a julgar que percebia aquele «resistir», tantas vezes tão sentido.
- É isso. Vamos tentando. Olha, como está a J?
- A J morreu. Foi há dez dias.
Disse-me assim a morte da mulher.
Com a mesma firmeza. Como se fosse natural, dizer-me aquilo assim.
E perguntou-me ainda pelos meus filhos, pelo Manel, pelos meus netos.
Como se fosse natural.

Agradeço-te muito, M.
Esta notícia assim com que também disseste a amizade que nos tens.

«Procuramos resistir.»
Firmes.
E vivos.
Sabendo o sabor da morte, cada vez mais perto.
Sabendo...

Sunday, June 08, 2008

E O RESTO?

Diante de mim, a noite, com uma lista de tarefas a cumprir manhã cedo.
Mas não resisto a estas palavras que não chegam a ser um apontamento.
Palavras entre a indignação e a festa.
Pois, a festa pela vitória de sábado no Portugal-Turquia.
E a indignação.
Porque todos os noticiários de domingo começavam com a mesma notícia, as mesmas imagens, as mesmas palavras. E eram longuíssimos.
Porque nos meus quase sessenta e oito anos nunca ouvi falar tanto de futebol no meu país.
Nunca. Nem no tempo de que nem quero dizer o nome.
Nada volta atrás e não seria bom.
Mas será isto andar para a frente?
O que é feito do «resto»?
Quem é que conta «o resto»?

E «o resto» é tanto, «o resto» é mesmo tanto...
Às vezes está tão perto.

Mas não vende. E não anestesia.

Monday, June 02, 2008

A ZARAGATOA

Até fui ao dicionário ver se existia esta palavra. Existe e diz «pequena esponja na ponta de um pauzinho para aplicar medicamentos na garganta».
Pois para mim, é a cura das anginas, das placas brancas que tenho tido a vida toda.
Para mim, é Tibaldinho. Eu regaladinha na cama a ler a condessa de Ségur, depois a Brigitte, depois Eça.
E sempre o meu pai. Mãozinha certeira. A zaragatoa que sempre me curou.
Estou outra vez, mais uma vez, com anginas. O Centro de Saúde. Um antibiótico fortíssimo. E eu, de rastos.

Faz-me falta a zaragatoa.
E passados estes anos todos espanto-me com essa mão certeira do meu pai, a quem nunca vi fazer o que quer que fosse em casa. O meu pai até pedia que lhe trouxessem um copo de água... Mas ia certinha a ponta do pauzinho aos pontos brancos da minha garganta.
Admirei sempre o meu pai por muitas coisas. Muitas mesmo. Também por essa milagrosa zaragatoa.

NB - Para as gerações de hoje, não façam isso aos cachopos, OK?

Wednesday, May 28, 2008

APOSENTAÇÃO,CHUVA DE MAIO...MALHAS PARA TECER.


Nada como uma reforma para «não ter tempo». E isso é bom. Pincelo os dias com vida. Às vezes até me condeno por «estar a dar pouco rendimento.» E estou. Mas verdade, verdade, são sessenta e sete, quase sessenta e oito.

Agora mesmo ia estender uma ropinha. E chove. É uma chuva mansa.
Esqueço a roupa e tento que esta serenidade tome conta de mim. Chover em Maio é qualquer coisa ao contrário. Contra a corrente. E não sei de quem as palavras «Chuva de Maio, melodia mansa, desejos brandos ...». Não sei de quem. Mas são de longe. De outrora e de hoje. Como em francês se diz «jadis».

Teço as últimas malhas da colchinha do bebé da C. Com esta serenidade de quem aprende a esperar. De quem quer aprender sempre a esperar.

E deixo ainda um pedido de desculpas à Inês. À quarta-feira, é um dia ocupado. Vou à catequese com os Marias.

E também um agradecimento ao Manel que me disse que ontem era o dia dos vizinhos. Maravilha! À falta de tempo para organizar um encontro num patamar, enfiei na caixa de correio de cada um, um chocolate. Marca branca. Pingo Doce. E um cartão. Umas palavras.

Está-se a ver que a minha vida só é rentável em afectos.
E fico serenamente agradecida.

Sunday, May 18, 2008

INÊS


Vá lá, Inês, confirme-me que leu a minha resposta em comentário na postagem anterior.
Para que eu fique tranquila, OK?
OK não se diz, mas vá...

Saturday, May 03, 2008

MULHER A DIAS VENDEDORA DE RAMOS DE ESPIGAS E DE AFECTOS


Pois eu já me esquecia de escrever o elogio enorme e sentido à Maria de Lourdes, que trabalhou a dias em casa dos meus sogros.
Há muito tempo que se mudou para fora de Lisboa.
Masvolta, todos os anos em dia de espiga, a carrinha carregada de molhos - papoilas, oliveira, espigas.

Na quinta feira fui regar cedinho as plantas da varanda e da esquina sôtora...(é assim que me trata).

Como eu não saí nem para ir ao café , ela veio cá a casa, um alguidar cheio de molhos. P'ra sôtora escolher.

Depois quer saber dos meninos que são os meus filhos. E faz-me confidências.

Bem haja, Maria de lourdes pela festa que traz nesses molhos.
Bem haja pela amizade sempre dita e renovada.

P'ró ano então, se Deus quiser.
Até lá saudades suas.

Friday, May 02, 2008

Agora ..


... só é o tempo de pensarmos nos afectos.
... e de os dizer,
quando podemos,
se podemos.
... talvez vejas que sorrio para ti, na distância a que deixaste a memória, os caracóis, os calções e essas aulas, já nem sei.
... e eu sem entender essa distância.

Agora, só é o tempo dos afectos. E de insistir no sorriso, devagar.

Vou tecer malhas para a manta do bebé da Catarina. E imagino ou sonho que deixando malhas por aí, escrevo os afectos.

Lá fora é Primavera. Há rosas no quintal. E sardinheiras.
Poiso a mão no teu ombro.
E estou aqui.

Friday, April 25, 2008

CHEGA O DIA AO FIM

E deixo tantas tarefas por cumprir.
E eu com dificuldade em aprender que é preciso deixar tarefas por cumprir.

Bom mesmo foi a tal senhora que me vendeu cravos e me disse há trinta e quatro anos que os vendo.

Bom foi um senhor ainda mais idoso do que eu a comprar-lhe um molho enorme.

Bom foi um amigo que, já eu quase em casa, atravessa a rua para me perguntar Onde é que compraste esses cravos.

Bom foram os comentários que me escreveram (a propósito Joana, sou tão incapaz que não consigo postar-lhe nada ...)e as postgens que li.

Bom, o cafezinho com a Z em honra do 25 de Abril.

Bom o casamento do Vítor Esteves, hoje, cm Tibaldinho e com muita festa.

Para todos e por tudo, os cravos ali na sala em lugar de honra.
Hoje
e
Sempre.

25 DE ABRIL HOJE


Quero sair p'rá rua.
Quero ver como «se anda por aí» (esta expressão não me parece muito bem...)
Quero dizer que vale a pena
Quero que o 25 de Abril seja hoje

Temos muitas memórias.
Mas quero este dia hoje.

Sei que vou encontrar uma senhora que vende cravos aqui, em Campo de Ourique, desde esse dia de 74. Ela vai dizer-me Há tantos anos que vendo cravos à senhora.
Sempre caríssimos.
E vou comprar-lhos. Poucos, já que a crise bate a todas as portas. Mas não mata a alegria nem a esperaança.

Ela
Eu
E algumas pessoas dizem que o 25 de Abril é também HOJE.

Wednesday, April 23, 2008

MONUMENTOS ÀS VÍTIMAS DA INQUISIÇÃO EM LISBOA

Vi hoje e saúdo os monumentos às vítimas da inquisição no Largo de S. Domingos em Lisboa.

Recomendo uma ida até lá.
E uma reflexão a todas as formas de intransigência que nos atravessam.

Para que nenhuma nos mova. Nunca.

Nota - Não tenho ainda nenhuma imagem. Os monumentos são lindos. Prometido que mal que tenha, ponho-as aqui.

ORAÇÃO PARA NOS LIVRAR DA TENTAÇÃO DA OMNIPOTÊNCIA

No último seminário da igreja de sta Isabel foi-nos dada esta oração de Pierre Faucher, que quero dizer todas as noites. Que me há-de ajudar a deixar o que não posso, a desprender-me do que não está ao meu alcance, a saber que realmente não sou Deus.

«Senhor, ensina-nos a repousar.
Ensina-nos
a deixar as coisas em suspenso,
a não querer arrumar tudo antes de dormir.
Ensina-nos
a aceitar estarmos cansados.
Ensina-nos a acabar uma jornada;
senão
nem saberíamos morrer.
Porque, depois de nós,
ainda haverá trabalho...
Ensina-nos
a aceitar que não somos Tu.»

SERÕES


Cá em casa é assim:

O Manel está tão cansado com um trabalho sem intervalo, que à noite sai da casa de jantar para o maple da sala. Liga o comando num canal qualquer. Eu ponho a loiça na máquina em dez minutos-somos só dois- e de volta à sala vejo-o a dormir com o tal comando na mão, cabeça e mãos pendidas... Às vezes assusto-me mesmo e chamo Manel. Quando ele ouve, o que é bom, responde deixa-me ou deixa-me estar.
Mas às vezes não responde,...

Parece que são assim os serões dos mais velhos. A mim ainda me custa. O melhor mesmo é seguir o conselho do nosso filho André Mãe, deixe o homem dormir.

Sunday, April 06, 2008

PARA LER E PENSAR

Porque inteiramente de acordo, transcrevo parte do artigo de Fr Bento Domingues publicado no domingo, dia 6, no jornal «Público» com o título Educação e cidadania,

«1. Alguns professores mostraram-se mais à vontade na televisão e na rua do que na escola. Nas televisões e na rua, foram expeditos a descompor o primeiro-ministro, a ministra, o ministério e os encarregados de educação. Na escola, queixam-se de não conseguirem dar aulas por medo dos alunos. Estes gozam de um estatuto que os torna indomáveis. Se, ainda há pouco, os professores eram considerados responsáveis pelo insucesso escolar, agora, a indignação voltou-se contra os alunos e os pais: cada turma deveria ter um segurança e cada professor um guarda-costas, sem recorrer aos psicólogos, aliados naturais da permissividade.
Alegrou-me ver, na televisão, o Prof. José Gameiro, psiquiatra, resistir à histeria criada em torno de um telemóvel – um dos novos símbolos mais estimados de adolescentes e jovens – transformada em arma política. Em relação à boa disciplina e segurança, tenho a referência da minha escola, nos começos dos anos 40 do século passado: nada de falinhas mansas; o marido da professora era um legionário de mão pesada, a quem ela recorria com frequência. A delicadeza dos pais sublinhava: “só se perdem as que caem no chão”.
2. Tenho, no entanto, alguma dificuldade em acreditar que alunos, professores, pais, funcionários e responsáveis do ministério se encontrem bem identificados nas imagens registadas nas últimas semanas. Aproveitando a onda, os professores queixosos talvez não sejam o único espelho da escola em Portugal.
Os meios de comunicação, em alguns casos, ainda não se libertaram da triste sina que lhes colaram: uma boa notícia não é notícia. Depois de terem colaborado na liquidação do ministro da saúde, acabaram por tecer os maiores elogios às medidas que ele tinha tomado, lamentando a sua saída como vítima de uma política eleitoralista...
Por outro lado, dizer que, em Portugal, é sempre assim, que nunca sabemos valorizar o que temos, que estamos sempre na cauda de tudo até na cauda do reconhecimento dos nossos méritos, alarga a maledicência, mas não cria alternativas. Os problemas não estão, isoladamente, na família, na escola, nos meios de comunicação, no futebol, na sociedade civil ou no Estado, nem se podem atribuir todas as graças e desgraças à globalização. O recurso a bodes expiatórios, fixando-se só em algumas pessoas, grupos, corporações, instituições, etnias, acaba por ter culpados de turno, mas não gera correntes diversas de cidadania responsável, que respeitem o princípio da boa medida e do bom senso.»

Monday, March 24, 2008

SEGUNDA FEIRA DE PÁSCOA, LIMPEZAS E POESIA


Foi com boa vontade que disse ao Manel Hoje nem saio de manhã. Vou dar uma mãozinha e trabalhar com a D.
Ele concordou pois tem que ser.

E eu três horas e meia a dizer é preciso limpar o parapeito. Olhe, é melhor abrir a janela primeiro... Estes livros estão cheios de pó...

Tentei mostrar-me paciente. Mas deixei de certeza passar «uma certa fúria».
A D a certa altura disse-me lá no Banco sou encarregada de toda a limpeza. E olhe que há lá tanto livro para limpar...

Bem, nem respondi.
Aquele parapeito ficou limpo. E mais duas prateleiras do quarto de trabalho. E a D. a precisar tanto do trabalho que lhe dou.

Amanhã vou sair bem cedinho. Vou mesmo.

Porque é que me lembro daquele poema de Manuel da Fonseca
«Ah as coisas incríveis que eu te contava assim misturadas com luas e estrelas
e o olhar vagaroso como o andar da noite!»

E que terminava mais ou menos assim

«Mas o certo é eu ser o terceiro oficial de finanças. da Câmara Municipal ...»

Nem o poeta alguma vez se resignou, nem eu.

O certo é eu ir sair. Cedinho.

Sunday, March 23, 2008

DA PACIFICAÇÃO OU DA SABEDORIA


Estou a ver o programa de homenagem à Simone.
Julgo que sempre gostei dela.
Admiro-lhe a determinação.
A coragem nas dificuldades. A alegria na luta permanente.

E depois gosto desse «gosto» pelas palavras. Que sempre lhe vêm de dentro.

Ao contrário, sempre «embirrei» um bocado com a Madalena Iglésias.

Hoje, aplaudo as duas. Vi-as no mesmo palco. Abraçadas. A cantar a vida.

É esta a sabedoria que os anos nos dão.
Benção do tempo.

DOMINGO DE PÁSCOA

Acordo e é Páscoa.
Está sol.

Quero guardar o sol.
E todos os recomeços. Ditos em palavras, em sorrisos, em silêncio, ditos em todos os afectos com que sustento a vida.

Louvo a manhã de Páscoa.

Sei quanto é verdadeira toda a ressurreição. É que que no meu bairro as pessoas dizem «Bom dia e boa Páscoa»
Recebo emails, sms, cartões, telefonemas.

Não há que duvidar.
Manhã.

Boa Páscoa para os que por aqui passarem. Com a plenitude da luz desta e de todas as manhãs.

Sunday, March 16, 2008

DOMINGO DE RAMOS


Ainda que pressionada por um tempo sempre exíguo, quero escrever esta postagem. Como se a cada um oferecesse um raminho.
É que hoje é Domingo de Ramos.
Neste dia, dantes, era hábito que os afilhados oferecessem aos padrinhos um raminho de flores. Singelo que fosse.

Vou encher a casa de verduras, talvez apanhadas do quintal que valem mais.

Gosto muito do evangelho inicial. Jesus entra em Jerusalém montado num jumentinho, «filho de uma jumenta»
Não se trata de uma entrada triunfal. É «num jumentinho...»

Se alguém se sentir motivado, encha também a sua casa de ramos . «Ramos de árvores» ou raminhos.
Para dizer talvez que na morte que havemos de ouvir esta semana, há uma esperança de vida.
Uma esperança...
Um raminho...

Tuesday, March 04, 2008

UMA HISTÓRIA SIMPLES


Pronto, enganei-me. O segundo filme chama-se «Uma história simples».

E lindo, lindíssimo.

Sunday, March 02, 2008

FILMES




Os filmes moram na nossa casa. Arrisco afirmar que habitam o coração de cada um de nós.
Sem explicação, hoje vamos menos ao cinema. Falta de tempo? Falta de dinheiro? Nada disso, quando éramos mesmo novos, nessa altura sim, tempo e dinheiro eram escassos e raros. Mas íamos. O que foi muito bom! Pelo menos, deixou esta paixão.

Escrevo «isto» a propósito dos filmes que foram o tema da festa de anos do Manuel. È que só podia...
E de dois filmes vistos há pouco tempo.
«Expiação» e «Uma vida simples».
«Expiação» é em tudo um filme lindo. Todo o décor. A música. As personagens. Os gestos. E o problema da culpa, real ou imaginária. Toca-me muito. É que transporto sempre uma culpa qualquer que mais nasce da dúvida, da escolha constante «entre isto ou aquilo». Este espaço intranquilo.

Mais me tocou «Uma vida simples».
Aquela viagem decidida, tranquila, longa, num carrito cortador de relva que puxava um atrelado enorme.
Aquela viagem de um velho para ir ter com um irmão que sofrera um AVC. Um irmão com quem estava desavindo.
Aquela viagem para a reconciliação. Para o encontro com quem o conhece melhor do que ninguém.
Por causa da infância comum.
Por causa da noite carregada de estrelas, que olhavam, meninos.
Ao rever «Uma vida simples», também eu fiz uma viagem. Pela vida toda.
Muitas vezes penso que a eternidade talvez seja esse ver e rever a vida toda. Alcançada enfim a serenidade. E as estrelas hão-de ser talvez todos os lugares. E todas as pessoas. Todas as mesas de festa onde estendi as toalhas de linho. E essa insistente tentativa de acolher bem.
As estrelas talvez sejam todas as malhas que teci para os meus netos. E para outros meninos.
As estrelas, pontos de afecto e de ternura da minha «vida simples».

QUERIDO PROFESSOR VITORINO




Ouvi na radio «Trinta anos passados da morte de Vitorino Nemésio».
Esperei então um tempo sem pressa para lhe dizer a gratidão por o ter tido como Professor.
Rendo-me. E aqui estou para o fazer, neste tempo afinal curto e tão sem jeito.
Só que consigo, Professor, só posso estar à vontade.
Também o senhor parecia «não ter jeito». Dizíamos, por tontice da idade, que nunca acabava o assunto de que começava a falar.
A paixão pelas palavras, o domínio das palavras, eram esse dom que lhe permitia o malabarismo de partir de ideia em ideia, de forma encantatória.

Sabe, toda a gente sabia, que eu faltava a imensas aulas.
Mas às suas, nunca.
E sempre pontual.

As disciplinas de opção foram sempre ministradas por si, já que era eu a escolhê-las.
Segui-o como um mestre que foi e que é.
Segui-o como um sonho.
Nunca nos deixam, nem os mestres nem os sonhos.

E depois, Professor, aquela gravata sempre tão mal posta. Os colarinhos da camisa para cima. As mãos enormes. A boca donde saíam a voz e as palavras e as ideias. Esse fascínio.

Prometi aos meus filhos, Professor, que os havia de levar a conhcê-lo, ali na casa da Sociedade Farmacêutica. Sem porquê, deixei passar o tempo. Uma manhã fui surpreendida pela notícia da sua morte. E levei comigo a Maria ao seu enterro. Talvez treze ou catorze anos. E nunca se esqueceu.

A essa tão pobre homenagem junto este texto. Para dizer a gratidão que a si me tem unido a vida toda.
E para sempre, Professor.

Monday, February 18, 2008

PALAVRAS

Elas dizem a vida
São sagradas
E no entanto vão mudando de sentido.

Hoje, ao chegar a casa o Manel informou-me que a Maria telefonou e disse...
Eu, com este vellho e tolo hábito de atrapalhar quem fala O menino ... referindo-me a um dos meus netos.
Não, insistia o Manel, tentando dizer-me o que queria, a Maria foi ao oftalmologista ...
Este atropelo lembrou-me outras conversas, tão espaçadas no tempo... Conversas que em si narram uma história.
Antes de nascer a nossa primeira filha, a menina era eu.
Quando ela nasceu, surpresa, o meu pai tocou bem cedo à campainha e perguntou à empregada se a menina estava bem e se a senhora estava em casa.
Menina, a nossa Maria! E eu, senhora.
Hoje, meninos, meninos são os meus netos, mesmo que na bendita escada que vai dos três anos aos dezassete, eu me refira ao Bernardo, o mais velho.
Meninos...
Em Tibaldinho, continuo a ser a menina, o que dá para entender que Tibaldinho é um berço.

As palavras são mesmo sagradas e dão tanto, mas tanto que pensar.
E que sentir.

Monday, February 11, 2008

INESPERADAMENTE

Levanto-me e inesperadamente a janela das traseiras escancara-se para o sol.
Está a mais o robe quente.
Inesperadamenete e, mesmo com a tíbia partida e muitas outras limitações do corpo e da alma, limitações de mim,
inesperadamente o sol, concede-me o dom da liberdade.

Wednesday, February 06, 2008

«ESQUECE A QUARTA-FEIRA...»

Cantámos,
trauteámos,
ouvimos no velho gira discos que veio de casa dos meus pais,
voltámos a ouvir.
E entranharam-se em nós o som e as palavras

«...esquece a quarta-feira e continua.»

E interpelam-me, desafiam-me, apetecem-me.
De novo, em cada ano.

Não esqueço a quarta-feira.
Mas continuo.

Sunday, February 03, 2008

SOFÁ DA SALA, MEMÓRIA E OS DIAS QUE HÃO-DE VIR

Quero ver a Câmara Clara.
Quero começar a ler um livro que o Manuel comprou e me apetece «Tudo o que sobe deve convergir».
Quero fazer as pegas pedidas pela Ana para a Sofia.
Quero ficar calada.
Quero saborear o fim do dia devagar.
Quero saborear todos os fins como começos.
Quero tantas coisas...
Quero fazer de conta que vou falar do sofá da sala e o que quero mesmo é dizer a dor pela morte da Pamela, sabendo que a sua vida marcará a minha vida, a nossa vida. Até ao fim.
Vamos então fingir que é do sofá da sala que falamos.
Temos dois. Mas usamos muito aquele, em frente da televisão, com um banquinho de pele para os pés. Está sempre muito gasto. Era ali que a Pamela se sentava. Há um ano, mandámo-lo arranjar. Pensámos que ia ser também para ela muito mais confortável.
Foi quando a Pamela adoeceu daquela forma brutal.
Nunca mais veio.
É verdade que o Manel se senta lá muitas vezes.
Ele continua a ter as molas boas. Está convidativo. Sólido.
Olho para o sofá.
De certo modo, quando vazio, o sofá é o lugar da Pamela.
E sei-lhe as palavras certas. Bondosas e divertidas. O juizo justo. O conselho tanta vez em forma de pergunta «A Teresa não acha...?»
Sei-lhe o sorriso.
E aquele último sorriso que lhe vi.

Monday, January 28, 2008

DESAFIO A DIZER UMA BOA NOTÍCIA

Sei que escrevo muito menos do que queria.
Muito menos do que penso que vale a pena.
Mas, desta vez, o meu desafio é maior do que esta série de tarefas em que se vai diluindo o dia.

Ouvi ontem, umas dez vezes ou mais as notícias lastimáveis de mortes neste país e o seu suposto relacionamento com as políticas de saúde. Ouvi a voz decidida e serena do ministro, que não conheço senão da comunicação social.
E pega-se, multiplica-se o azedume.

Quero deixar aqui o desafio de que se escrevam, se divulguem, se dê visibilidade ÀS BOAS NOTÍCIAS.
É que elas estão por aí.
Mas são chãs e rasteirinhas.
E não vendem.

Monday, January 21, 2008

PORQUE AGRADEÇO...

Recebi este comentário numa postagem. Transcrevo-o, porque o agradeço, pois reflecte muita sabedoria e muita serenidade. Diz assim:
«A morte não me parece nem uma "boa" nem uma "má" razão. É só uma razão. Há algum tempo, morreu uma pessoa que me era próxima e desde então penso que nos falta serenidade para encarar a dita - a dos outros e a nossa. É tão certo que ela aconteça. Porquê julgar uma coisa tão natural? Porque nos sentimos sós? Porque temos medo? Não há espaço no mundo para que todos vivam. A natureza renova-se todos os dias. Porque não aceitá-lo pacificamente ou tanto quanto os nossos medos o permitam?»

A dor da morte, a ausência, esse «nunca mais» é para mim uma realidade difícil.
Mas há que procurar aprender. Sempre.

Ontem ouvi alguém dizer que uma situação muito difícil é sempre o desafio de um recomeço.

Junto esta afirmação ao comentário que recebi.

E peço a Deus que me ajude a saber fazer de cada situação uma acção de graças.

Saturday, January 19, 2008

ÎNÊS

Vim espreitar.
E que bom dar com as suas palavras.
Combinado.
Só mesmo dizer.

E vou ter uma noite melhor.
Boa noite para si.
Doce de morango também ajuda.

Friday, January 11, 2008

À ESPERA DE OUTRO TEMPO

Tão «abandonado » este espaço!
E tão lembrado.
Sempre esta espécie de desculpa enganadora
«amanhã vou ter mais tempo».

Decidi voltar SEM TEMPO.
Só talvez para dizer «que esse outro tempo» nunca vem
Que a vida se faz assim de tempos sem tempo
De tempos que nunca são especiais. E que são sempre especiais.
De tempos com a casa desarrumada
Com os cartões de natal por responder
Com amigos à espera de um telefonema
Tanta coisa...
Tanta ...
Mas vale voltar
Com saudades. Com afecto. Com dias de alegria. Com dias de súbito assaltados pela rapidez. Pelo medo das esquinas. Ou com medo do vento?
Dias atravessados por um quase nada. Ou um nada.
A vida assim.

Vale voltar.

A propósito, amanhã vamos a Tibaldinho. Não por uma boa razão ( a morte de um amigo). Mas voltar a Tibaldinho é sempre muito bom.
São tantos os lugares a que pertencemos!