Monday, February 26, 2007

Sunday, February 25, 2007

DAVID MOURÃO FERREIRA

Ontem o professor, o poeta teria feito oitenta anos.
Foi bom lembrá-lo.
É bom dizê-lo aqui.

Como me espantei, no primeiro ano da faculdade de ir ter uma cadeira, que ele ensinava, com o nome de «Teoria da Literatura». Eu, refilona sempre «Teoria da Literatura, não podia ser».
E com que arte ele nos conseguiu fazer perceber que tudo, tudo, se trabalha. Muito.
As palavras parecem «tão espontâneas».
Parecem.
E vamos sempre buscá-las muito fundo.
Muito fundo, professor.

DESABAFOS A PROPÓSITO DE «O GRANDE SILÊNCIO

Fomos ver «O grande silêncio». Tal qual esperávamos.
Tivemos saudades deste silêncio que por dentro nos povoa.
Tivemos saudades duns tempos de retiro, bons para nós, e que faziam felizes a Maria e o André com a casa toda enfim por sua conta.
E tivemos saudades do Mário. Amigo único. Monge eremita,
na cidade, numa capela ao pé da Sé, onde quando alguém entrava, estava sempre em primeiro lugar. Parava tudo. Mesmo as missas . E quem chegava, era acolhido de forma única.
Quando o Bernardo nasceu e a Maria e o Paulo o levaram lá, ele fez uma festa enorme. O Mário tocou os sinos. Tocou-os durante muito tempo. Tocou-os de forma que se ouvissem muito. Na cidade.
Quando a minha mãe morreu o Mário, de hábito branco, apareceu na basílica da Estrela para me dizer «Teresa, canta Aleluia». Talvez eu ainda hoje não tenha percebido. Mas o Mário afirmou o mistério. E eu não me esqueço.

Monday, February 19, 2007

CEGO É O QUE NÃO VÊ O ROSTO DA POBREZA

A nossa empregada acaba de telefonar. Que não vem. Que tem gipe e está cheia de febre.
A X nasceu na Madeira. Por causa da extrema pobreza foi muito criança para a Venezuela. Aí casou.
E também por causa da pobreza veio para Portugal. Ela, o marido, três filhos e os sogros.
Trabalha numa limpeza desde as seis da manhã. Chega a casa às dez da noite.
Disse-nos há uns dias que nunca tinha estado doente.
É uma mulher alegre e cumpridora.

Às vezes, tantas vezes, somos cegos ao rosto da pobreza, que cruza as nossas vidas.
Que cruza a cada passo as nossas vidas.

Monday, February 12, 2007

A ARCA DE CÂNFORA

Hoje abri a arca dos bordados. Toda a gente estava lá. Tudo e todos bem misturadinhos. Como a vida.
A «parure» de casamento da minha mãe («parure» é a roupa interior), o meu fato de primeira comunhão, a envolta que a avó Alice fez para a Laranjinnha e o seu fato de baptismo. Uma capa do André se mascarar, Zorro parece. A amostra de que fiz o xaile dos meus netos mais velhos.
Lençóis - só dois - ainda por estrear. Amarelitos, claro.
E eu a desdobrar cada peça devagarinho, deixando escorrer entre os dedos memórias e ternura. E a dizer cada nome. Também devagarinho.

Quando era nova, eu achava aquela arca horrível mesmo, pirosíssima. Tinha vindo de África. É difícil de limpar.
O que a gente muda!
E como é bom saber que a vida a tudo nos ensina a dar sentido.
Hoje, foi a vez da arca.

Sunday, February 11, 2007

O DOM DA MEMÓRIA

Lembro-me de muitas coisas, parece que às vezes vêm do fundo, uma espécie de arca mais arrumada do que a das roupas.
A minha avó paterna vivia com muitas dificuldades económicas, muitas mesmo. Como na época todas as avós.
Mas naquela visita que lhe fazíamos aos domingos, os meu primos e eu, lá estava SEMPRE, SEMPRE um bolo para os netos.
Outro dia, dei comigo a dizer para mim que estes tempos modernos nos trouxeram conquistas, mas quantas de nós, e é só por mim que falo, esquecemos este ritual do BOLO DOMINICAL PARA OS NETOS.
E cá estou eu, feliz nesta noite de sábado, bolinho pronto para os rapazes. Lindo, sobre um pano branco bordado à mão (de Tibaldinho, claro).
E à conta do referendo, os Marias vêm almoçar.
Boa!
Vivam os referendos!
E tudo o que é razão para a mesa posta, ainda que só um bolo.

Wednesday, February 07, 2007

COMO SE TECE UMA ORAÇÃO

Vou tricotar uns casaquinhos pequenos que só costumam servir durante a primeira semana de vida das crianças, que o digam a Maria e a Aninhas.
É que três amigas minhas vão ter netos lá para o Verão.
Eu teço malhas. Coisa que me dá muita serenidade.
Gesto cheio de memória. Gesto cheio de história e de histórias.
Prece que se faz também p'las minhas mãos.

Tuesday, February 06, 2007

IINTERMEZZO

Este tempo todo sem escrever, não é normal.
É verdade que o Manuel atacou a Net a tempo inteiro e que me levanto mais tarde.
É verdade que tive uma gripe ou virose (que confusão!!! ) que me deixou mesmo tão down. Mas já estou boa. Ou bem melhor.

Entre 18 de Janeiro (o dia dos anos da Maria) e hoje, 7 de Fevereiro, aconteceu muita coisa que ficou por anotar. E as coisas «invisíveis» vão ficar por dizer, esquecidas ou apenas por um tempo retidas entre a mente e as palavras.

O mais importante foi que NO DIA 3, O NOSSO NETO PRIMOGÉNITO, O BERNARDO, FEZ DEZASSEIS ANOS
Aquele rapaz fantástico que me escreve comentários no blog. O grande amigo do avô Manel. E meu, claro. Esta é a grande notícia deste intermezzo.
Para ti, toda a ternura da avó Teté. Que às vezes te chateia com verbos, cadernos passados a limpo, «se eu fosse tua professora, ...», «tira os cotovelos de cima da mesa», «não fales tão alto», «tudo desarrumado, Bernardo», «não me respondes assim»... e tu, super bom e generoso como és e como vais ser a vida toda, a perguntares se a avó está zangada. E eu a dizer-te UM AMOR DO TAMANHO DO MUNDO. E tu a saberes que é mesmo isso que eu te estou a dizer. SEMPRE.