Monday, July 31, 2006

AO MEU IRMÃO ÁRABE, O QUE HABITA A TERRA

Meu irmão colérico que se revolta,
meu orgulhoso irmão cheio de ofensas,
meu irmão emboscado entre as minhas debilidades
e o que se ri do meu cansaço,
o que se alegra com a minha desgraça
e espera sem descanso a minha queda...

...Meu irmão que me atira pedras
querendo esmagar a minha têmpora,
o que se alegra
mostrando as costas aos seus perseguidores,
que desperta cada manhã com uma esperança nova
e cada noite sobe ao leito
com o coração perplexo e quebrantado...

... Meu irmão entusiasta no seu sofrer,
que morde com apetite as suas próprias carnes,
que se rebola em penúrias
e deseja a piedade do céu e o fim de toda a maravilha,
e mesmo assim não acha soluções.

Meu irmão e meu opositor,
meu irmão "homem do meu anátema",
meu irmão de pátria e do fluir do sangue,
irmão da penúria e da morte, mas, ao fim e ao cabo,
irmão de um futuro que ninguém imagina!...

Meu irmão que levanta o seu olhar para as montanhas
interrogando de onde virá a sua salvação...
Tu bem o sabes, no interior do coração,
mesmo que os teus lábios jamais o confessem,
que não possuis outra ajuda a não ser eu.
Eu, teu irmão e teu anátema.

Só tu sabes que eu não estou entre os que pregam
nas tribunas das tuas cidades e aldeias,
nem nos países que os teus irmãos habitam além fronteiras,
que eu não estou entre os que intrigam
e ambicionam as tuas riquezas,
nas grandes capitais e em luxuosos escritórios,
nas cortes dos poderosos, reis e governantes;
que não estou entre os eruditos do livro
e os que abrem a boca só diante de altifalantes,
os que pregam teorias
a partir das cátedras em faculdades distantes
e em meios de comunicação
próximos, aqui na nossa terra
e nos países que estão para além do mar...

Quem como tu sabe,
em certos momentos de verdade e de dúvida,
cada dia mais frequentes,
quando chegas à mais íntima das tuas moradas interiores,
que a tua redenção não virá dos que vociferam nas ruas de Teerão,
nem dos que sugam o petróleo dos poços do Kuwait e Barhein,
nem dos cambistas de G'eda e Abu Daby...;
nem da águia que é bandeira e insígnia
nas margens doPotomac,
nem do grande urso que habita nas estepes da Rússia...
E se ainda não dispuseste o coração para o revelares aos teus lábios,
dir‑to‑ei eu na cara, mesmo que tapes os ouvidos:
Só em Israel está a tua salvação e nele está a tua esperança!

Porque, apesar da mão que pega na funda,
e da mão prolongada na tocha incendiária,
e da mão que agita o garrote,
só num pacto de irmãos comigo verás a esperança,
só no caminho que percorreres comigo, ombro a ombro,
conheceremos ambos bonança e glória.

E se te atrevesses a levantar o olhar e a dirigi-lo para mais longe,
se te atrevesses a aspirar até ao insondável,
para além do vale das amarguras,
aqui, onde nos dedicamos a lavrar sobre as costas do outro,
poderias comprovar que só juntos estamos condenados
à grandeza nesta terra comum que nos tocou.

Esta é uma determinação do destino,
como a de elevar os nossos montes
por cima de todos os montes,
para que o nosso país seja governante entre países,
grande entre as nações, crisol de raças,
construído tijolo a tijolo,
orgulho dos filhos e glória dos pais,
torre-fortaleza para os vizinhos
e farol de luz para os que estão longe...

E saberás que só na unidade haverá esperança para nós
e na fraternidade encontrarás a felicidade.

E saberás que não podes fugir de mim, nem eu de ti.
E saberás que a terra é uma só e sem ela nada haverá para nós,
nem para mim nem para ti;
e se muitos são os caminhos que nos obrigam a descer muito abaixo,
só um é o caminho que nos pode levar até ao cimo;
ainda que se multipliquem os inimigos e provocadores,
os emboscados que desejam o nosso mal,
ainda que o caminho seja pavimentado
com os nossos próprios cadáveres,
um só é o nosso credo: o de subir juntos, por ele,
erguendo bem alto uma bandeira comum!

Portanto não desesperes, tu, que és prisioneiro da esperança,
porque ainda falta o nosso sol nascer:
o mesmo sol para ti e para mim,
o mesmo sol que nos aquece!

(in ARÓN AMIR; 'Ereribah, Tel Aviv, 1988)

Saturday, July 29, 2006

DIÁRIOS DA BÓSNIA

É imperdível.
Urgente ver este filme.
Nele, todas as dores.
Vistas, guardadas em imagens. Por dentro.

DETESTO ARRUMAÇÕES

Detesto arrumações.
E nunca mudei de casa, imaginem.
Roupa, vai depressa embora, à excepção do casaco de pele da minha mãe. Que não uso. Não quero para nada. E lhe ficava tão bem. E que não diz comigo…
Mas as fotografias.
As cartas de namoro.
Os postais, que acho «tão giros». Que volto a ler todos os anos.
E os livros.
O primeiro livro de poemas que o Manuel me deu «Toi et Moi».
E a biblioteca que o Manuel herdou do tio Luís. E os livros do tio João embaixador. E os que encontrámos no chão nas quintas abandonadas em Tibaldinho…
E uma quantidade de malhas e de rendas que começo e quase nunca acabo.

Neste mês de arrumar, vivo quase sufocada.
Ao mesmo tempo, é mesmo tudo tão giro.
Nesta balbúrdia não faço nada.
Nas minhas mãos, todos os anos, se dedilha a vida.
Devagar pego em cada peça. Miro-a e remiro-a.
E torna-se sagrada.
Cada ano.

Wednesday, July 26, 2006

AVÓS

Para a «leitaria», o texto da oração que escrevi para hoje, dia dos avós e que foi emitido na RR.
Não que eu goste muito de dias.
Mas acredito ou tenho esperança que os afectos hão-de mudar esta violência toda. Hão-de mesmo.

«Por causa dos gestos de ternura
E do tempo sem medida,

Porque são companheiros do sonho
E se esmeram a fazer-lhes coroas de reis e espadas de papel,

Porque eles sabem tudo
E dizem as memórias de ontem e de hoje
Com histórias vagarosas,

Porque os conduzem à raiz da alegria
E gostariam de sempre os proteger,

Porque os vejo pelas ruas, guiando-lhes os passos,
E nos jardins se reencontram com todas as infâncias,

Estende, Senhor, sobre os avós, a Tua infinita misericórdia.
Lembra-lhes que deles é também o Teu reino
Porque é a Ti que acolhem
Quando, sem condições, estendem os braços aos netos,
A todos os meninos.»

Sunday, July 23, 2006

PELA PAZ

Proposto por Bento XVI, tão ao encontro dos mais profundos desejos de toda a humanidade, este dia de 23 de Julho como dia de oração e penitência pela paz

Friday, July 21, 2006

DEIXAR-ME SURPREENDER

Um desencontro incómodo. Um género de vida que parece não me ir bem.
Depois da tal reforma…

E acreditar que hei-de dar tantas voltas até que aceite um tempo outro e de novo me encontre.
Redescobrir-me ao virar duma esquina.
Nesse estilo que tem sido sempre o meu.
De agradecer. Por tudo e por todos. Às vezes, mais parece uma ideia fixa ou uma teimosia. Mas é o meu respirar. A forma de viver.
E caminhar sempre. Pelas ruas. Pela vida.
E deixar-me cada dia surpreender.

PALAVRAS DE ALEGRIA

Para te dizer obrigada, Victor de Melo Barreto.
Meu único primo.
Porque fizeste aquela festa de anos.
E é muito bom festejar a vida. Assim.
A vida. Sempre.

Thursday, July 13, 2006

PERMITIR PORQUÊ?

Foi hoje na loja de um oculista em Campo de Ourique.
Tenho a certeza que o dono da mesma me conhece há muito tempo.
Eu, assustada com esta tensão ocular que tem estado alta, passei por lá. «Que talvez fosse melhor medi-la.» (tinha visto um anúncio e um preçário para este serviço)
Expliquei que estava a pôr uns pingos.
«Olhe que não é preciso, se está a pôr esses pingos fique sossegada.»
Não lhe paguei assim uns tantos euros. E fiquei calma.

Esta honestidade é uma atitude tão oposta à dos anúncios que nos entram pela casa dentro, sem licença e que nos corrompem e nos aprisionam, «É só telefonar. Crédito imediato. De … a não sei quantos mil euros.»
No mínimo desonesto e imoral.
Porque é que havemos de permitir?
Porquê?

PROFESSORA COMPANHEIRA

A Maria Helena faz hoje anos.
Colega fantástica. Na escola. Na vida.
Professora de Religião e Moral. Professora de tudo, pois então.
O dia inteiro na escola. Sem horário obrigatório. A saber que era preciso estar lá para ajudar todos os rapazes, todas as raparigas e todos os problemas.
Hoje falou-nos de um aluno, filho de mãe prostituta que, ferido com a agressão de um colega, lhe dissera «Eu sei que sou, mas que ninguém chame nomes à minha mãe».
Foi «do lado do rapaz» que a Maria Helena falou.
Professora. Companheira.
Vida a cruzar as nossas vidas.
E ao fim deste teu dia de anos, gratidão.

Saturday, July 08, 2006

COPCON

O COPCON vai reunir-se amanhã, dia 9 de Julho, em assembleia magna.
O COPCON é uma Comunidade Organizada Para Comunicar Optimismo Natural.
Os membros do Copcon são solidários.
São alegres.
São activos.
Reúnem-se sempre à volta de uma mesa para comer e beber. É aí que falam de tudo, confrontam as suas ideias (geralmente diferentes e muito variadas); fazem-no de forma frontal;
muitas vezes discutem;
quase sempre riem muito.
O Copcon gosta de deixar tudo e todos «de pernas para o ar».

São todos «corredores», isto é, ou se põem a caminho para ir ter com o outro, ou vencem as inércias e telefonam, mandam e-mails e SMS e até escrevem postais.

O membros do Copcon tecem entre si toda a espécie de laços.
Gostam e praticam todas as formas de comunicar.
E, quando um deles se separa para sempre (essa «coisa» que se diz natural e que se chama «morte»), os membros do Copcon acreditam que hão-de voltar a reunir-se em qualquer sítio à volta de uma mesa para comer e beber, falar alto, discutir, rir, sentir e dizer todos os afectos.

Os membros do Copcon reúnem-se amanhã em alegre assembleia magna.

Fica muito por dizer, mas ouso deixar na «leitaria» este «cheirinho». O resto há-de ser escrito. Revelado. Talvez até haja uma fotografia que eu consiga aqui pôr.

Wednesday, July 05, 2006

A CRISE

Pronto, fomos agora eliminados das meias finais… mas com bom resultado. Viva a alegria!
Hoje, pensei na crise económica… que até vou aceitando, mas dei comigo a fazer «história».
É assim:
quando nos casámos tínhamos mesmo pouco dinheiro. Fazíamos malabarismos, mas não perdíamos um bom filme nem teatro.
Às vezes, optámos por escolhas «esquisitas». Quando do 25 de Abril, «por solidariedade» e por sonho, vendemos o carro. «Que não precisávamos. Que havia outras pessoas … »
O que me custa um bocado na crise actual é que com quase sessenta e seis anos (o Manel ainda um bocadito mais), temos que contar as despesas diárias como no princípio. Às vezes, até acho gira esta espécie de luta. «A ver se saio vencedora». Mas não deixa de ser «luta».
Pronto, temos estado cá sempre para isto.
Só que há tanta, tanta gente que nem consegue já lutar.