Sunday, January 25, 2009

EM LOUVOR DA VIDA

Faz hoje anos a A e a L.
Hesito.
A A não gosta de fazer anos.
Ou diz que não gosta.
Mas ousei. Peguei no telefone, quase a medo e surpreendi-me.
Estava feliz. Voz aberta e franca.

E disse-me «Olha, até já dei graças por mais um ano».
Boa!
Parabéns redobrados.

Por causa destas coisas que fazem a vida e parecem coisas de nada, é para ela, é para todos que deixo o poema de Torga, de que sempre gostei tanto:

BUCÓLICA

A vida é feita de nadas
De grandes serras paradas
À espera de movimento;
De searas onduladas
Pelo vento;

De casas de moradia
Caídas e com sinais
De ninhos que outrora havia
Nos beirais;

De poeira;
De sombra de uma figueira;
De ver esta maravilha:
Meu Pai erguer uma videira
Como uma mãe que faz a trança à filha.


S. Martinho de Anta, 30 de Abril de 1937

Friday, January 02, 2009

NATAL EM JEITO DE COMPAIXÃO

De Adília Lopes,
porque diz «Natal» em jeito de compaixão:

«Amar uma pedra, um cão, uma osga, uma barata.
Amar uma pessoa que não gosta de nós.
Amar uma pessoa de quem não gostamos.
O amor é mais difícil do que a mecânica quântica.
Fernando Pessoa, num poema em que caridade rima com electricidade,
diz que não tem caridade.

Às vezes, aquilo a que chamamos amor não é amor:
- é exigir em troca
- é dar para que dês

Amar alguém é confiar nessa pessoa, não estar de pé atrás,
Acreditar nessa pessoa. Gostamos pouco uns dos outros,
Disse Tonino guerrra.
Quero amar e ser amado, dizia Jorge Luís Borges, é muito
Ambicioso, não é humilde.
Acho que devemos pedir só para amar.
É fácil amar quando a vida nos corre bem.
Quando a vida nos corre mal, insultamos o mundo e, às
vezes, insultamos Deus. Acreditar então nas coisas mais queridas,
mais pequeninas:
- as medalhinhas do nosso Baptismo, que entretanto foram roubadas,
se perderam..
- a imagem de Nossa senhora de Fátima comprada na loja dos 300.
- dois versos de uma oração de que esquecemos o resto.

Às vezes, a vida corre-nos muito bem e esquecemo-nos da
compaixão. A compaixão é o amor. Só a compaixão salva. Só
a compaixão é eterna.
O sofrimento nem sempre se vê. E o sucesso, como o desespero,
pode cegar.

Às vezes, temos grandes amigos e não sabemos. A padeira do
nosso, o vizinho do nosso prédio. Anos e anos a dizer:
«Bom dia! Boa tarde!», mais nada, e essas palavras bastaram.

O amor nem precisa de palavras. Mas as palavras sabem bem.»